Por que alguns pais decidem pedir permissão para entrar no quarto de seus filhos?

Leia minha resposta original no Quora.

Porque o entendimento de privacidade é fundamental para a formação de um ser humano, e porque todos os seres humanos fazem algumas atividades que requerem privacidade e respeito a ela.

Obviamente, o primeiro motivo é a masturbação. Tanto mulheres quanto homens se masturbam, e agora que chegamos em um ponto mais sólido de igualdade entre os sexos, não se deve esperar mais a masturbação de um homem do que de uma mulher, então, a menos que os pais queiram passar por uma experiência bem desagradável de flagrarem a intimidade dos filhos em momento inoportuno, não deveriam simplesmente sair empurrando a porta.

Além disso, existem leituras, pinturas e concentrações que são quebradas por interrupções, e isso é irritante para qualquer pessoa. Está na lista de inúmeros itens que geram ressentimento. Ser incomodado enquanto se estuda é extremamente desagradável.

Pais que decidem controlar o acesso aos quartos dos filhos criam filhos neuróticos e inseguros, que nunca se sentem realmente sozinhos e criam uma vontade nada saudável de esconder suas intimidades. Isso se traduz pra vida, e de forma negativa.

Não acho que essa seja uma pergunta que exija muitos parágrafos, a privacidade mínima e básica é motivo o suficiente para você bater na porta. Por favor!

A tecnologia costumava ser para os ricos. Agora eles pagam para evitá-la.

O que estamos vendo agora é a ‘luxurificação’ do contato humano.

Toque humano

Milton Pedraza é um especialista em como os ricos gastam seu dinheiro.

O CEO e fundador da Luxury Institute, uma firma de consultoria de artigos e serviços de luxo, recentemente contou ao The New York Times que uma das maiores commodities entre os megarricos atualmente não é uma motocicleta voadora ou um iate de R$ 20 milhões: é o contato humano.

“O que estamos vendo agora é a luxurificação do contato humano”, disse Pedraza ao jornal — e essa tendência pode ampliar a lacuna entre os ricos e os pobres.

Saindo fora

Quando os computadores pessoais começaram a chegar ao mercado nos anos 80, eles eram caros, e nem tão necessários para navegar o mundo. Então, no começo, as únicas pessoas que os tinham eram aquelas com uma renda disponível significativa.

Nas décadas desde então, os PCs e a enxurrada de dispositivos que surgiram deles se tornaram muito mais baratos, o que significa que o tempo na frente da tela passou de algo que todos queriam para algo que agora ninguém pode evitar — a não ser que se tenha muito dinheiro, de toda forma.

De acordo com o NYTimes, enquanto escolas públicas cortam gastos transferindo as aulas para telas de laptop ao invés de usarem instrutores de carne e osso — chegando a até mesmo ignorar protestos dos pais — os cidadãos mais ricos do Vale do Silício pagam para mandar suas crianças para escolas particulares que prometem uma “educação praticamente livre de telas”.

Enquanto isso, os pais da classe trabalhadora dos alunos da escola pública estão se vendo forçados a um estado de disponibilidade 24h por dia, 7 dias por semana, para seus empregadores graças aos seus smartphones. Esses empregadores, em contraste à tendência, têm o “direito de desconectar”, graças às suas posições hierárquicas no ambiente de trabalho.

E quanto àquela renda disponível que antes era gasta na tecnologia mais recente, os ricos agora estão preferindo gastar em jantares e viagens, de acordo com Pedraza.

“Agora a educação, empreendimentos da saúde, todos estão começando a estudar como tornar as experiências mais humanas”, disse ele ao NYTimes. “O humano é muito importante agora.”

Altamente suspeito

O problema potencial dessa transição está no impacto desconhecido do tempo de tela para a saúde humana, particularmente no que tange ao desenvolvimento dos cérebros das crianças.

Um estudo recente encontrou mudanças físicas nos cérebros de crianças que passaram mais tempo em frente às telas, assim como uma conexão entre o tempo de tela e pontuações mais baixas em testes de raciocínio e linguagem. Se isso for confirmado em estudos adicionais, poderia significar que as crianças das classes médias e baixas passando mais tempo em frente às telas poderiam ter uma desvantagem educacional ou até cognitiva se comparadas aos seus semelhantes mais ricos.

Até agora, no entanto, os pesquisadores ainda precisam confirmar que a troca do contato humano por telas é prejudicial, mas o fato de que as elites do Vale do Silício — cujas vidas dependem em manter os olhos das pessoas nas telas — estejam dispostas a pagar caro para garantir que seus filhos não fiquem grudados a seus dispositivos… Não é algo que inspira muita confiança.

O artigo original foi escrito em inglês por Kristin Houser no site Futurism.

A nova inovação é neutralizar o celular – e “desmudar” o mundo!

No final do semestre passado, no saguão branco e reluzente do Madison Square Garden, atendentes uniformizados foram designados a checkpoints de segurança para tornar milhares de smartphones inúteis. Chris Rock estava fazendo seu 10º show em uma turnê internacional de 12 cidades, e a cada parada, cada convidado era obrigado a passar pela entrada, confirmar que seu celular estava em vibracall ou silencioso, e então entregá-lo a um segurança que o colocava em uma bolsa cinza inviolável de neopreno — fazendo com que o aparelho ficasse totalmente inacessível. O homem de terno à minha frente na fila, claramente vindo direto do trabalho, tinha dois celulares, cada um dos quais precisou de sua própria bolsinha. O garoto atrás de mim lamentou que não poderia transmitir sua noite no Snapchat. A amiga que eu tinha vindo encontrar não estava em lugar nenhum, e depois de colocar meu celular na bolsa, não podia mandar mensagem para perguntar onde ela estava. Finalmente a encontrei perto da escada rolante. “Isso foi estranhamente assustador,” ela disse, rindo.

Com celular… // Créditos: NBC News

O show começaria em 45 minutos. Ainda haviam assentos para encontrar, visitas ao banheiro para fazer, garrafas de água para comprar. E por todo o saguão, as mãos por todo lado estavam inquietas. Era como se todos os 5.500 de nós tivéssemos sido reduzidos, pela simples e repentina desativação dos nossos celulares, em uma sala cheia de viciados sem sua droga.

Passávamos manteiga de cacau sem necessidade, rasgávamos nossos lencinhos, estalávamos os dedos. Os realmente desesperados poderiam se aliviar em uma “zona do telefone” com divisória do lado de fora do auditório, onde um funcionário destravaria a bolsa enquanto você ficasse no local do tamanho de um banheiro. “Preciso avisar à minha esposa que não tem sinal aqui,” disse um homem a seu amigo antes de entrar. Uma mulher passou rindo: “É como uma área de fumantes! Olha para todos esses viciados.” Enquanto isso, os que resistiam à tentação de usar seus aparelhos 5 minutos após terem guardado, reclamavam que não sabiam a hora.

…e sem celular. // Créditos: Yondr

Yondr, uma empresa de São Francisco com 17 empregados e sem investimento de capital de risco, foi responsável pela restrição aos celulares. Suas pequenas bolsas de tecido, que fecham com um cadeado patenteado que só pode ser aberto com um dispositivo da própria Yondr, têm sido usadas em shows de Alicia Keys, Childish Gambino e Guns N’ Roses, e em apresentações de comediantes como Rock, Dave Chappelle e Ali Wong, que não querem seus materiais vazados no YouTube ou seus públicos distraídos pelo Instagram. São usadas em hospitais e centros de reabilitação para reforçar a conformidade com as leis de privacidade na saúde, em centrais de atendimento para proteger informações sigilosas de clientes, em igrejas para focar a atenção no Todo-poderoso, e em cortes para evitar a intimidação de testemunhas. São usadas em mais de 600 escolas públicas dos EUA para forçar as crianças, enfim, a olhar para o quadro, e não para as telas. O engenhoso e descomplicado pedaço de pano só tem uma função: limitar o uso de smartphones onde as pessoas no comando não o quiserem, o que é ótimo se significa que artistas podem se expressar livremente ou que nós podemos ir ao médico sem medo de estar sendo gravados. Mas quando significa sufocar a expressão em lugares onde smartphones se tornam cada vez mais a nossa melhor chance de documentar abusos, crimes crônicos, e contar ao mundo o que vemos, o objeto toma uma dimensão diferente, e mais obscura. “O smartphone é muitas coisas,” diz Jay Stanley, analista de políticas sênior da União Americana pelas Liberdades Civis (ACLU). “Uma forma de invasão da privacidade” — algo do qual precisamos nos proteger — “mas também um instrumento da liberdade de expressão.”

Conheci Graham Dugoni, fundador do Yondr, enquanto tomávamos alguns drinks em Williamsburg, Brooklyn. Ele estaria em Nova York por dois dias, encontrando-se com vendedores, clientes e parceiros de negócios para discutir como e por que deveriam usar o Yondr. “Todo mundo entende muito intuitivamente,” diz ele. “Nossa dependência dos celulares não é tão intelectual. É muito mais uma coisa corporal, então sempre esteve claro para mim que qualquer solução que houvesse para este problema deveria ser, por si mesma, física e tangível.”

Créditos: Veloxity.us

Este problema. É um que todos temos. Checar o Instagram 897 vezes por dia. Atualizar o Twitter e nem ler o que aparece. Sentir nossos telefones vibrando, imaginando que um estranho bacana veio nos oferecer o emprego dos sonhos, e depois nos odiarmos por sermos tão ingênuos. “Se você usa um dispositivo o tempo todo, ele vai afetar seu sistema nervoso e afetar seus padrões de pensamento e interação social. É somente uma checagem de impulsos que precisamos, eu acho,” diz Dugoni. Ele vê isso como uma época nova e desajeitada da humanidade onde podemos todos precisar de um pouco de ajuda para sermos nossa melhor versão. “Em nossa sociedade moderna atomizada e hiperconectada,” diz ele, “entrar em um espaço livre de celulares fornece a fundação da atenção continuada, diálogo e liberdade de expressão.”

Dugoni, que tem 31 anos e projeta a confiança física de um atleta de esportes radicais, tem um celular flip e afirma que não lê as notícias. “Eu sou muito seletivo quanto às coisas que recebo,” ele me conta. “Tenho um palpite de que a raça humana não esteja preparada para os estímulos visuais e auditivos atuais.” E desde a fundação do Yondr em 2014, ele considerou sua responsabilidade tentar nos trazer de volta a um tempo onde os celulares não eram tudo e em todo lugar. Ele quer que des-mudemos o mundo. “Vejo isso como um movimento,” diz ele. “De verdade.”

Dugoni cresceu em Portland, Oregon, estudou Ciência Política na Universidade Duke, e jogou futebol profissional na Noruega até que um ferimento o forçou a sair do campo direto para as finanças. Aos 24, ele se mudou para Atlanta, onde trabalhou infeliz para uma firma de investimento médio, e pela primeira vez na sua vida passava 8 horas por dia em frente a uma mesa. Posteriormente, Dugoni se mudou para a Bay Area e passou alguns meses trabalhando em várias startups, mas também odiava isso. Em 2012, em um festival de música em São Francisco, ele testemunhou dois estranhos filmando um bêbado dançando sem se importar; eles então postaram o vídeo no YouTube. Chocado, Dugoni começou a pensar sobre como poderia ter prevenido esses estranhos de fazer de um momento particular de alguém um espetáculo público. Uma ferramenta, talvez, para criar um espaço livre de telefones.

Ele passou o próximo ano e meio pesquisando opções, lendo sobre sociologia, fenomenologia e filosofia da tecnologia. E em 2014, depois de fazer experimentos com diferentes conceitos, incluindo um escaninho que guardaria celulares individualmente, ele se decidiu por uma bolsa que deixaria as pessoas guardarem seus celulares sem poder usá-los. Pelos próximos seis meses, ele passou noites avaliando materiais do Alibaba, o conglomerado de e-comércio, e falando no telefone com fornecedores chineses de tecidos e plásticos. Ele então ficava na mesa de sua cozinha até a alta madrugada criando pequenas luvas parecidas com mangas de capa de chuva e colocando celulares dentro delas. Depois de 10 protótipos, ele criou uma versão que trancava e destrancava facilmente. Ele tinha esse produto, e juntou US$ 100.000 (R$ 320.000) com ajuda da família, amigos, investidores-anjo e sua própria poupança para fabricar e comercializar a bolsa.

Graham Dugoni passou por 10 protótipos antes de aperfeiçoar o encaixe e funcionalidade do Yondr. Foto: Maria Lokke

Desde o começo, produtores de shows entenderam o atrativo da bolsa, e canais de entretenimento se tornaram os primeiros clientes do Yondr. Isso mudou em 2016, quando Joseph Evers, administrador da corte do condado da Filadélfia, foi assistir uma apresentação de comédia no Cassino Valley Forge. Quando o segurança pediu por seu celular, colocou-o dentro de uma bolsa e a trancou, Evers percebeu que poderia solucionar um grande problema nos julgamentos. Naquele tempo, ele estava tendo dificuldades com intimidações a testemunhas: as pessoas estavam indo a audiências e postando fotos dos procedimentos nas redes sociais. “Já tentamos coletar os celulares, mas era um pesadelo,” ele me conta. “Levava tempo demais, e aconteciam muitos danos [aos aparelhos] pelos quais tínhamos que pagar.” O Yondr parecia ser a solução óbvia. Alguns dias depois, ele entrou em contato com a empresa, e um funcionário atravessou o país com algumas amostras. Evers os apresentou ao conselho administrativo das cortes da Filadélfia, e todos concordaram imediatamente e unanimemente. Agora, em um dia qualquer, cerca de 2.000 bolsas Yondr são usadas nas cortes da Filadélfia.

No início, segundo Evers, havia preocupação de que as pessoas iriam estranhar o processo, mas não foi o caso. “Não tem muito drama,” diz ele. “As pessoas entram na fila e fazem o que têmq ue fazer.” Evers diz que a corte tem visto uma “mudança dramática” no número de reclamções de postagens nas redes sociais identificando testemunhas e oficiais infiltrados. “A procuradoria e a polícia são os que mais saem ganhando,” diz ele. Renunciar ao telefone “é um pequeno preço a pagar pela segurança.”

Michael Richards, comediante conhecido por Seinfeld. Créditos: Biography.com

Adam Schwartz não tem tanta certeza. Advogado dos funcionários na Electronic Frontier Foundation, uma ONG baseada em São Francisco devotada a defender as liberdades civis no mundo digital, Schwartz me escreveu por e-mail que a organização está “preocupada com tecnologias que incapacitam, mesmo que temporariamente, todas as coisas benéficas que uma pessoa pode fazer com o smartphone.” Quando liguei para pedir que ele elaborasse, ele citou um vídeo, feito por um estudante da Carolina do Sul em 2015, mostrando um oficial da polícia jogando o corpo contra uma estudante negra do sexo feminino por perturbar a paz da aula. Ele me lembrou da gravação cheia de codinomes do comediante Michael Richards em 2006 que levaram ao debate sobre o uso de insultos raciais na comédia. Ele também falou da preocupação de que seus próprios filhos adolescentes deveriam ter acesso aos celulares para ligar 190 caso um atirador aparecesse na escola.

A tecnologia inverteu as estruturas tradicionais de poder com agilidade sem precedentes, e o controle de quase qualquer situação está gradualmente indo para as mãos (literalmente) daquele que está gravando. Nossos telefones nos tornaram em ciborges socialmente conectados, aumentando o significado da visão, da fala e da audição; tirando nossa habilidade de usar esses dispositivos, podemos estar comprometendo algo que não só está se tornando essencial para nós, mas sobre nós. “Há dez anos, muitas poucas pessoas andaram por aí com uma câmera ou gravadora, e poderia-se dizer facilmente que o Yondr está meramente restaurando o status quo,” diz Schwartz. “Mas a questão é, estamos melhores hoje, agora que qualquer um pode registrar maus feitos instantaneamente?”

Movimento Black Lives Matter.

Apesar de toda a reclamação que fazemos como indivíduos — sobre companhias rudes para o jantar que olham o celular a cada mordida, ou nossa própria inabilidade de sentar com calma e ler romances sem ficar impacientes — quase ninguém disputaria que smartphones ajudaram a catalisar alguns dos movimentos sociais mais importantes dos últimos anos. Black Lives Matter, Occupy Wall Street, a luta contra o assédio sexual em campi universitários: todos foram facilitados, ao menos parcialmente, pelas gravações capturadas e distribuídas via smartphones e redes sociais. Já vimos tentativas de impedir esta nova expressão democratizada, e são frequentemente desafiadas legalmente — depois que manifestantes alegaram que departamentos da polícia estavam usando bloqueadores de sinal para interceptar transmissões de seus celulares, a Comissão Federal de Comunicações (FCC) dos EUA lançaram um comunicado em 2014 chamando a prática de ilegal, exceto se autorizada especialmente por agentes federais. O Yondr é uma empresa privada, não o Estado, e ninguém abriu uma ação contra a empresa ou seus clientes. Mas Gene Policinski, Diretor de Operações do Newseum Institute e do Institute’s First Ammendment Center, acha que a tecnologia que desativa smartphones será “litigada de novo e de novo.” Dispositivos que restringem o uso de aparelhos como o as bolsas Yondr parecem inócuos, diz ele, “mas representam algo que poderia se tornar potencialmente perigoso.” Por meio de uma hipotética: e se os cidadãos precisassem colocar seus celulares em bolsas Yondr ou algo como elas antes de ir a uma reunião pública do conselho municipal? Isso poderia ser feito em nome da segurança, é claro, mas com um efeito potencial de silenciamento enorme.

E que se esqueça hipotéticas; até mesmo nos tipos de situações para que as bolsas Yondr foram pensadas originalmente, as aplicações potenciais são problemáticas. E se houvessem bolsas Yondr na apresentação de Hannibal Buress, quando ele contou uma piada amplamente creditada por dar início à atrasada derrubada de Bill Cosby? E o que interpretar do fato de que, após sete meses da piada sobre Cosby, Buress pulou de cabeça na ideia do Yondr e começou a impedir sua plateia de gravar suas apresentações?

Jay Stanley, da ACLU, compreende a simplicidade e a elegância do método do Yondr, mas preocupa-se que essa própria simplicidade — a escorregada sem fricção do celular para dentro da bolsa, a velocidade aparente da bolsa — poderia levar alguém a acreditar que não estão realmente abrindo mão de nada. Dugoni reconhece as preocupações: “O equilíbrio entre privacidade e transparência não é simples, e a vigilância e habilidade de gravar outras pessoas na esfera pública criam um dilema unicamente moderno.”

Ainda assim, ele acha que ganhamos mais do que perdemos ao restringir o uso de celulares: “Qual é a etiqueta dos smartphones?”, ele pergunta. “Você costumava poder fumar em um avião, e agora não pode fumar nem na rua, dependendo do lugar.” Dugoni acredita que a legislação restringente de celulares em certos locais públicos também é inevitável. “Já existem bares livre de telefones,” diz ele, referindo-se a estabelecimentos que bloqueiam o sinal de celular para encorajar a sociabilidade. “E vamos ter que determinar onde celulares podem ser usados ao responder uma questão radicalmente nova: o que significa ser humano em um mundo com um smartphone no bolso?”

Ao fim da apresentação de Chris Rock, fomos todos direcionados para fora do local. Seguranças estavam próximos à saída para abrir as bolsas. Reunidos a nossos telefones, apertávamos a tela desesperadamente, enquanto nos esbarrávamos e rolávamos os olhos. Eu recebi alguns e-mails do trabalho, mas nada urgente. Meu amigo havia mandado uma mensagem, perguntando quando eu chegaria em casa. Só algumas horas haviam se passado. Mas pareciam ter sido 10.

Texto escrito por Alice Gregory e traduzido do site WIRED.

Cidades inteligentes podem significar o fim da privacidade

A ascensão da Cidade Inteligente

A cidade de Barcelona é um alvoroço sensorial. Prédios elaborados com mosaicos brilham sob palmeiras que balançam com o vento enquanto comerciantes oferecem seus produtos em espanhol e catalão. No meio de tantas cores e sons, seria fácil deixar passar as proteções cinzas de plástico que apareceram nos postes da via principal da cidade. É mais fácil ainda deixar passar o que contêm: caixas com sensores que coletam dados de tudo ao redor deles.

Cada sensor está equipado com seu próprio disco rígido e um sensor conectado ao Wi-Fi que rastreia elementos do ambiente, como barulho, tamanho da multidão, poluição e congestionamentos no trânsito, e depois transmite tudo para um banco de dados central via fibra ótica. A Fortune relata que os sensores podem monitorar até mesmo o número de selfies postada em uma área.

Barcelona. Fonte: R7

Sob o charme de Mundo Antigo, Barcelona está equipada com tecnologia do Mundo Novo, o que levou a firma de pesquisa de mercado digital Juniper Research a conceder à cidade o título de mais inteligente em 2015. Mas ela não manteve o destaque por muito tempo — Cingapura passou na frente no ano seguinte. Ao redor do mundo, câmeras municipais estão ocupando suas cidades para coletar uma quantidade crescente de dados sobre seus cidadãos e atividades. Barcelona, Boston, Londres, Dubai e Hamburgo já começaram o processo; a Índia tem metas ambiciosas de renovar 100 de suas cidades até 2022. Cingapura pretende se tornar a primeira “Nação Inteligente” do mundo.

Todos esses esforços prometem tornar as cidades mais limpas, mais seguras, mais sustentáveis e mais eficientes. Mas eticistas têm uma preocupação diferente: como os cidadãos manterão a privacidade quando dados estão sendo coletados por todos os lados?

Alguém está vendo

Cidades inteligentes dependem primordialmente de dois tipos de informação: dados agregados e dados em tempo real. Sensores agregam dados sobre um lugar ou objeto específico em redes maiores de computação, que então analisam grandes quantidades de informação para encontrar tendências. Algumas cidades já usaram dados agredados — para monitorar as vagas de carro mais populares no centro de Londres, analisar o trânsito e encontrar riscos no trânsito de Boston, e para ajustar o brilho de postes de acordo com a quantidade de pessoas em parques de Barcelona. Pelos dados serem agregados, são efetivamente anonimizados; não podem ser usados para rastrear indivíduos ou obter informações sobre eles.

Cidades também estão coletando dados em tempo real, que de fato focam em indivíduos. Em 2013, uma empresa chamada Renew London fez um programa piloto no qual sensores instalados em lixeiras rastreavam os sinais de Wi-Fi dos celulares que passavam. Os sensores conseguiam, então, usar o endereço único de controle de acesso de mídia (MAC) para filtrar os anúncios na lixeira pensando no indivíduo, baseando-se no movimento do mesmo na rede de sensores. Por exemplo, se o indivíduo acabou de passar por uma loja de roupas ou restaurante em particular, ele(a) poderia passar a ver mais anúncios para aquele local.

Uma foto dos materiais de marketing criados pelo agora finado Renew London initiative. Créditos: Quartz

Renew tentou trazer ao mundo real os anúncios direcionados que os usuários costumam ver online. No entanto, ao contrário da maior parte dos sites, a empresa não era legalmente obrigada a informar aos cidadãos que eles estavam sendo rastreados. Depois que os detalhes emergiram (e o ultraje se instaurou), o governo municipal de Londres pediu que a Renew encerrasse o teste.

Apesar da rejeição, muitas outras cidades ainda procuram por iniciativas de coleta de dados em tempo real. Em Cingapura, por exemplo, o governo planeja requerer que todos os carros tenham um sistema de navegação por satélite que monitorará a localização de cada veículo a qualquer momento, além da velocidade e da direção. Esse sistema de rastreio permitirá que o governo cobre automaticamente por taxas de estacionamento e multas, assim como levantar um imposto baseado na frequência em que o indivíduo dirige.

A nação-ilha também está testando vários programas que coletam dados sobre questões da infraestrutura da cidade e a quantidade de energia usada em unidades individuais de habitações mantidas pelo governo (80% da população vive nesses complexos). Os mais velhos e enfermos poderiam se voluntariar a um programa que monitora o movimento dentro de suas casas.

Ao passo que mais objetos começam a se conectar na internet, vão coletar mais informação ainda.

 

“Todos os dias — apenas com nossos smartphones, cartões de crédito, etc. — deixamos para trás muitas pegadas digitais, que são então gravadas milhares de vezes todos os dias e armazenadas em algum lugar da nuvem,” diz Carlo Ratti, diretor do Laboratório da Cidade Sensorial do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT). Esse mar de dados poderia permitir que cidades criassem novos programas de cidade inteligente, com a intenção de melhorar nossas vidas.

Mas os programas não são imunes de riscos. “O preocupante sobre isso é que vivemos em um mundo assimétrico, onde somente algumas empresas e instituições públicas sabem muito sobre nós enquanto sabemos pouco sobre eles,” diz Carlo. Camuflados em suas caixas pretas de informação, essas empresas poderiam estar vendendo informações pessoais para anunciantes e marqueteiros, ou permitindo que hackers ganhem acesso à informação que os usuários nem sabiam que haviam entregado.

Londres. Fonte: SmartCitiesWorld

Ratti acredita que a melhor estratégia para combater o mau uso potential desses dados seria que futuros governantes e organizações dessas cidades inteligentes implementassem um “contrato de dados” mais transparente e flexível entre indivíduos, empresas e governos. Alguns lugares já estão começando com esses contratos — o Regulamento de Proteção Geral de Dados (GDPR), anunciado para começar a ter efeito em meados de maio de 2018, vai requerer que todas as empresas na União Europeia compartilhem o tipo de dados que coletam de cidadãos, e peçam o consentimento dos indivíduos para usá-los (embora seja interessante apontar que o regulamento não toca na coleta de dados feita por governos).

A lei também permite que cidadãos da U. E. saiam do sistema e sejam “esquecidos,” ou ter dados pessoais — da ID do telefone à sequência genética — removidos de qualquer banco de dados caso não sintam que há uma razão justificável de mantê-los lá.

Para manter as futuras iniciativas de cidades inteligentes transparente, Ratti disse que “tirar vantagem dessas novas regras que logo entrarão em efeito será uma ótima forma de pressionar empresas que coletam grandes volumes de dados hoje.”

Cidade hackeada

Dados tão extraordinários e complexos poderiam, particularmente, por indivíduos em risco se caíssem nas mãos de hackers. Na conferência de segurança computacional Black Hat em 2015, os estudiosos de segurança Greg Conti, Tom Cross e David Raymond mostraram em uma apresentação e subsequente estudo que a segurança da informação em uma cidade é muito diferente da de uma empresa privada:

As cidades caracterizam interdependências complexas entre agências e infraestruturas que são uma combinação da indústria privada e organizações governamentais locais, estaduais e federais, todos trabalhando proximamente em conjunto para manter a cidade funcionando corretamente e por completo. O preparo [contra hackers] varia significativamente. Algumas cidades têm a coisa sob controle, mas outras são um emaranhado de feudos individuais criados sobre casas de baralho tecnológicas feitas em casa.

“Vai ser uma batalha sem fim entre hackers e defensores, assim como já acontece,” diz Christos Cassandras, professor de Engenharia Elétrica, Engenharia de Computação e diretor da divisão de Engenharia de Sistemas na Universidade de Boston. Empresas privadas e instituições municipais provavelmente precisarão ter se coordenar melhor nos esforços de segurança.

Hackers são uma ameaça perpétua, e tudo conectado à internet é vulnerável. Ratti aponta que hackear sempre foi parte da introdução à tecnologia de telecomunicações; em 1903, durante uma das primeiras demonstrações da tecnologia de transmissão a rádio entre Cornwall e Londres, um mágico de um café-concerto hackeou o sistema para transmitir várias mensagens chulas ao público esperando — e logo se escandalizando — da Academia Real das Ciências.

A melhor ferramenta para enfrentar hackers em cidades inteligentes, diz Ratti, pode ser a que muitas equipes de segurança computacional usam hoje: hackers do chapéu branco (white hat). Engenheiros tentam infiltrar um sistema como um hacker faria para identificarem vulnerabilidades que hackers de fato poderiam explorar (não para conseguir informações, como o hacker faria).

Cingapura. Fonte: LivingInSingapore

“[Hackers do chapéu branco] podem se tornar a prática padrão — uma espécie de simulação de incêndio cibernética — para governos e empresas, mesmo enquanto as pesquisas acadêmica e industrial focam no desenvolvimento de defesas técnicas mais avançadas nos anos subsequentes,” disse Ratti.

Por fim, há a ameaça de que os próprios governos usem os dados com propósitos nefastos. Como a Engadget aponta, o avaliador de democracia Freedom House classifica Cingapura como apenas “parcialmente livre” devido ao histórico do partido detentor do poder de suprimir dissidentes.

Há receio, portanto, de que dados coletados pelo governo possam ser usados contra dissidentes políticos. A instituição de caridade de defesa da privacidade Privacy International expressou preocupações com a falta de leis de privacidade em Cingapura em 2015, particularmente por conta da constituição de lá não garantir o direito à privacidade, e o fato do governo não haver ratificado o Pacto Internacional de Direitos Políticos e Civis que inclui uma cláusula que protege a privacidade. Analistas de políticas e estudiosos da indústria ecoam estas considerações, tanto sobre Cingapura quanto cidades inteligentes de forma geral.

Preocupações como essas são amplificadas em países com registros ainda mais manchados de direitos humanos e liberdades civis, como os Emirados Árabes Unidos.

Boston. Fonte: Michael Langlois

Cingapura tem feito esforços para mitigar estes medos e garantir aos cidadãos que sua segurança será protegida. Vivian Balakrishnan, o ministro de relações exteriores e líder da Iniciativa da Nação Inteligente do país, disse à Engadget que sob o Plano de Nação Inteligente, somente “dados de trânsito anonimizados serão coletados e agregados” de estradas com pedágio, e que oficiais irão “empreender consultores independentes de segurança” para testar o sistema contra vulnerabilidades. Ele adiciona que o governo cingaporeano está dedicado a tornar a nação em “uma sociedade open-source que é caracterizada por altos níveis de confiança, transparência e receptividade.”

No fim das contas, no entanto, dependerá de cada cidadão — em Cingapura e outras cidades inteligentes do mundo — ficar de olho nesses novos programas enquanto são implementados. Os cidadãos só podem cobrar as promessas de segurança dos governos se souberem quais dados estão sendo coletados sobre eles.

Na velocidade da tecnologia

Há alguns anos, quando Cassandras começou a fazer palestras sobre cidades inteligentes, ele costumava contar à sua plateia que achava que a maior parte da tecnologia que discutia estaria presente entre 10 e 15 anos depois. Hoje, ele admite que estava errado — a tecnologia chegou muito antes. Agora ele antecipa que o progresso será ainda mais rápido.

Cassandras acredita que a competitividade resultou nesse crescimento. “As empresas privadas estão sob muita pressão na competição global,” diz ele. Adiciona que “tudo que leva são dois ou três jogadores indo um mais rápido que o outro” para avançar rapidamente a indústria inteira.

Dubai. Fonte: Drinkpreneur

As cidades, similarmente, estão sob pressão para se tornar muito mais sofisticadas em um espaço curto de tempo. Muitas regiões metropolitanas estão se expandindo muito rapidamente, então alguns governantes podem escolher tecnologias inteligentes para evitar problemas como poluição, superlotações perigosas e ruas com pouca segurança. Uma cidade que falha em encarar esses problemas podem ser infestadas de problemas de saúde, desafios legais e uma queda na população — cidadãos e empresas podem se sentir tentados a realocar para centros mais limpos e modernos.

“Com mais frequência do que não, nesse processo há muitos riscos.”

Cassandras vê riscos na velocidade desse crescimento. “Com mais frequência do que não, nesse processo há muitos riscos,” diz ele. “Algumas vezes o desenvolvimento comercial tende a colocar esses riscos, esses perigos, preocupações de lado no esforço de chegar primeiro e ter lucro primeiro.”

Ainda assim, ele não acha os dados coletados por cidades inteligentes mais preocupante do que o que já é coletado online. “Estou mais preocupado com minha privacidade quando compro algo na Amazon ou informo meu cartão de crédito por uma passagem de avião”, diz ele. Cassandras e muitos estudiosos dessas tecnologias emergentes acabam vendo as cidades inteligentes como uma evolução da vida humana, no fim das contas. Se feito da forma certa, as cidades inteligentes conferirão aos seus cidadãos vidas mais limpas, seguras e eficientes — desde que os dados em nosso ambiente de convivência seja administrado da mesma forma que defendemos nossas casas e ruas.

Texto traduzido do site Futurism.

Black Mirror China: não é série, é realidade

Resumo:

O governo chinês planeja lançar seu Sistema de Crédito Social em 2020. O objetivo? Julgar a confiança – ou falta dela – de seus 1,3 bilhão de cidadãos.

Em 14 de junho, 2014, o Conselho do Estado da China publicou um documento bem sinistro chamado “Esboço de Planejamento para a Construção de um Sistema de Crédito Social.” Pela forma que a política chinesa documentou, era um texto extenso e bem seco, mas continha uma ideia radical: e se houvesse uma pontuação nacional de confiança que classificasse que tipo de cidadão você é?

Imagine um mundo onde muitas das suas atividades diárias fossem monitoradas e avaliadas constantemente: o que você compra nas lojas e na internet; onde você está em determinado momento; quem são seus amigos e como você interage com eles; quantas horas passa assistindo conteúdo ou jogando vídeogame; e quais contas e impostos você paga (ou não). Não é difícil imaginar, porque a maior parte dessas coisas já acontece graças a todos os gigantes coletores de dados como o Google, Facebook e o Instagram ou aplicativos que analisam sua saúde como o Fitbit. Mas agora, imagine um sistema onde todos esses comportamentos são avaliados como positivos ou negativos e agrupados em um número único, de acordo com regras definidas pelo governo. Essa seria sua Pontuação de Cidadão e diria a todos se você é confiável ou não. Além disso, sua pontuação seria colocada publicamente em um ranking de toda a população e usada para determinar sua qualificação para um financiamento ou um emprego, onde seus filhos poderiam ir à escola ou até mesmo suas chances de conseguir um encontro.

Uma visão futurista de um Big Brother fora de controle? Não, já está no horizonte na China, onde o governo está desenvolvendo o Sistema de Crédito Social (SCS) para avaliar a confiabilidade de seus 1,3 bilhão de cidadãos. O governo chinês está anunciando o sistema como uma forma desejável de medir e aumentar a “confiança” em toda a nação e criar uma cultura de “sinceridade.” Como a política aponta, “Isso forjará um ambiente de opiniões públicas onde manter a confiança será glorioso. Fortalecerá a sinceridade em assuntos do governo, no meio comercial, social e na construção da credibilidade judicial.”

Outros são menos otimistas sobre os verdadeiros propósitos do sistema. “É muito ambicioso, tanto em profundidade quanto alcance, e inclui o escrutínio do comportamento individual e de quais livros as pessoas estão lendo. É o rastreamento de consumo da Amazon com um toque político Orwelliano,” descreve Johan Lagerkvist, um especialista na internet chinesa do Instituto Sueco de Negócios Internacionais, sobre o sistema de crédito social. Rogier Creemers, um pós-doutor que atualmente se especializa nas leis e no governo chineses no Instituo Van Vollenhoven da Universidade de Leiden e publicou uma detalhada tradução do plano, comparou-o a “Críticas no Yelp com o Estado Babá observando sobre o seu ombro.”

Por agora, tecnicamente, participar das Pontuações de Cidadãos da China é voluntário. Mas até 2020 será obrigatório. O comportamento de cada cidadão e pessoa legal (o que inclui todas as empresas ou entidades) na China será pontuado e avaliado, quer queiram ou não.

Créditos: Kevin Hong.

Antes do lançamento nacional em 2020, o governo chinês está usando da política do ver e aprender. Nesse casamento entre supervisão comunista e capacidade capitalista, o governo concedeu uma licença a oito empresas privadas para criar sistemas e algoritmos para as pontuações de crédito social. Previsivelmente, gigantes dos dados lideram os dois projetos mais conhecidos.

O primeiro é o China Rapid Finance, parceiro da gigante rede social Tencent e desenvolvedora do aplicativo de mensagens WeChat, que conta com mais de 850 milhões de usuários ativos. O outro, Sesame Credit, é gerenciado pelo Ant Financial Services Group (AFSG), uma companhia afiliada ao Alibaba. O Ant Financial vende pacotes de seguro e fornece empréstimos para empresas de pequeno a médio porte. No entanto, a grande estrela da Ant é o AliPay, uma divisão de pagamentos que as pessoas usam não só para compras online, mas também para restaurantes, táxis, tarifas escolares, ingressos de cinema e até mesmo para transferir dinheiro.

O Sesame Credit também se juntou a outras plataformas que gerenciam dados, como o Didi Chuxing, companhia de transportes cuja maior competição era o Uber na China antes dele ter suas operações chinesas compradas pela mesma em 2016, e o Baihe, maior serviço de relacionamentos do país na internet. Não é difícil perceber como tudo acrescenta-se a uma quantidade imensurável de dados que o Sesame Credit pode consultar para avaliar como as pessoas se comportam e pontuá-las de acordo.

Então como as pessoas são pontuadas? Indivíduos no Sesame Credit são avaliados com valores entre 350 e 950 pontos. O Alibaba não divulga o “complexo algoritmo” que usa para calcular o número, mas revela cinco fatores levados em conta. O primeiro é o histórico de crédito. Por exemplo, o cidadão paga sua conta elétrica ou de telefone antes do vencimento? Em seguida é a capacidade de cumprimento, algo definido nas regras como “a habilidade do usuário de cumprir com suas obrigações contratuais.” O terceiro fator são características pessoais, verificando informações pessoais como o número de telefone e endereço. Mas a quarta categoria, comportamento e preferências, é onde as coisas ficam interessantes.

Nesse sistema, algo tão inócuo quanto os hábitos de consumo de uma pessoa se tornam uma medida de caráter. O Alibaba admite que julga as pessoas pelos tipos de produtos que compram. “Alguém que joga vídeogames 10 horas por dia, por exemplo, seria considerada uma pessoa ociosa,” diz Li Yingyun, Diretor de Tecnologia da Sesame. “Alguém que compra fraldas com frequência seria considerado um provável pai, que na média tem um pouco mais de responsabilidade.” Então o sistema não investiga somente o comportamento, ele o molda, “sacode” os cidadãos para longe de compras e comportamentos que o governo não aprova.

Os amigos também importam. A quinta categoria são relações interpessoais. O que suas escolhas de amigos online e suas interações dizem sobre quem é avaliado? Compartilhar o que o Sesame Credit descreve como “energia positiva” online, mensagens positivas sobre o governo ou o quão boa a economia do país está farão sua pontuação subir.

O Alibaba garante que, atualmente, coisas negativas postadas em mídias sociais não afetam as pontuações (não sabemos se é verdade ou não porque o algoritmo é secreto), mas dá para ver como isso pode ficar quando o sistema de pontuação de cidadãos do governo for oficialmente lançado em 2020. Embora ainda não haja indicação de que qualquer uma das oito empresas envolvidas no esquema piloto em andamento será realmente responsável por coordenar o sistema do governo, é difícil acreditar que não vão querer extrair o máximo possível de dados para o SCS dos pilotos. Se isso acontecer, e continue como o novo padrão no próprio SCS do governo, resultará em plataformas privadas agindo essencialmente como agências de espionagem para o governo. Podem nem ter escolha.

Postar opiniões políticas negativas ou links que mencionem a Praça de Tiananmen nunca foram atitudes recomendáveis na China, mas no futuro isso poderia afetar diretamente a pontuação de um cidadão. Mas aqui está a grande jogada: a pontuação de uma pessoa também será afetada pelo que seus amigos online dizem me fazem além do contato direto entre eles. Se alguém a quem estão conectados postar um comentário negativo, a própria pontuação será diminuída.

Então por que milhões de pessoas já se inscreveram para um teste de um sistema de supervisão do governo financiado pelo público? Podem haver motivos mais obscuros e não declarados – o medo de reprimendas, por exemplo, para quem não erguer as mãos – mas também há algo chamativo, na forma de recompensas e “privilégios especiais” para os cidadãos que se provem “confiáveis” no Sesame Credit.

Se a pontuação chega a 600, o cidadão pode requerer um empréstimo de até 5.000 yuan (cerca de R$ 2470) para fazer compras online, desde que seja no site do Alibaba. Chegue a 650 e é possível alugar um carro sem fazer um depósito de entrada. Também é possível fazer check-in mais rapidamente em um hotel e usar o check-in VIP do Aeroporto Internacional de Pequim. Aqueles com mais de 666 pontos podem fazer um empréstimo de até 50.000 yuan (R$ 24.690), obviamente do Ant Financial Services. Tenha mais de 700 e você poderá se inscrever para viagens a Cingapura sem precisar de documentos complementares como uma carta do empregador. Com 750, é agilizado o processo de inscrição para receber um cobiçado visto Schengen para se deslocar pela Europa inteira. “Acho que a melhor forma de entender o sistema é como o filho bastardo de um programa de fidelidade,” diz Creemers.

Pontuações mais altas já se tornaram um símbolo de status, com quase 100.000 pessoas se gabando de suas pontuações no Weibo (o equivalente chinês do Twitter) em meses após o lançamento. A pontuação de um cidadão pode até mesmo afetar suas chances de conseguir um encontro ou um parceiro para o casamento, porque quanto mais alta apontuação Sesame, mais proeminente o perfil no Baihe.

Sesame Credit já oferece dicas para ajudar os indivíduos a melhorar suas pontuações, incluindo avisos sobre o lado ruim de fazer amizade com alguém que tem nota baixa. Isso pode dar espaço a conselheiros de pontuação, que compartilharão dicas sobre como ganhar pontos, ou consultores de reputação dispostos a oferecer conselhos de experts sobre como melhorar uma pontuação estrategicamente ou sair da lista negra de confiança.

Sesame Credit é realmente um jogo inserido nos grandes dados pessoais que emula os métodos de supervisão do Partido Comunista: o inquietante dang’an. O regime mantinha um dossiê de todos os indivíduos que investigam transgressões políticas e pessoais. O dang’an de um cidadão o segue pelo resto da vida, da escola ao emprego. As pessoas começaram a denunciar amigos e até mesmo familiares, criando suspeitas e diminuindo a confiança social na China. O mesmo vai acontecer com dossiês digitais. As pessoas terão incentivo para dizer aos amigos de família, “Não poste isso. Não quero que perca pontos e também não quero que faça eu perder os meus.”

Também veremos o surgimento de mercados negros de reputação vendendo formas ocultas de aumentar a confiança. Da mesma forma que as curtidas do Facebook e do Twitter podem ser compradas, indivíduos pagarão para manipular seus pontos. E a questão da segurança do sistema? Hackers (e até mesmo pessoas contratadas do governo) poderiam mudar ou roubar informações gravadas digitalmente.

“Pessoas com pontuações baixas terão velocidades menores de internet, acesso restringido a restaurantes e a remoção do direito de viajar”

Rachel Botsman, autora de “Em Quem Você Pode Confiar?” (tradução livre)

O novo sistema reflete uma astuta mudança de paradigma. Como apontado anteriormente, ao invés de tentar reforçar a estabilidade ou conformidade com um cabo comprido e uma boa dose de medo, o governo está tentando fazer com que a obediência seja como estar jogando. É um método de controle social travestido em um sistema de recompensas de pontos. É o vídeogame da obediência.

Em um bairro da moda no centro de Pequim, os serviços de notícias da BBC foram às ruas em outubro de 2015 para perguntar às pessoas sobre suas pontuações no Sesame Credit. A maior parte falou dos lados positivos. Mas é inevitável se perguntar, quem criticaria publicamente o sistema? Ding, sua pontuação pode cair. Foi alarmante constatar que poucos compreenderam que uma pontuação ruim poderia afetá-los no futuro. Mais preocupante ainda foi a quantidade de pessoas que não tinham ideia que estavam sendo avaliadas.

Atualmente, o Sesame Credit não penaliza diretamente as pessoas por não serem “confiáveis” – ele é mais eficiente em atrair pessoas com brindes pelo bom comportamento. Mas Hu Tao, chefe administrativo do Sesame Credit, alerta as pessoas de que o sistema é projetado para que “pessoas não-confiáveis não possam alugar um carro, pedir dinheiro emprestado ou até mesmo achar um emprego.” Ela até mesmo informou que o Sesame Credit entrou em contato com o Escritório de Educação da China para compartilhar uma lista de estudantes que colaram em exames nacionais para que eles paguem no futuro pela desonestidade.

As penas estão fadadas a mudar dramaticamente quando o sistema do governo se tornar obrigatório em 2020. Em 25 de setembro de 2016, o Escritório Geral do Conselho de Estado atualizou sua política chamada “Mecanismos de Alerta e Punição para Pessoas que Quebram a Confiança.” O princípio primordial é simples: “Se a confiança for quebrada em um local, restrições são impostas em todos,” segundo o documento da política.

Por exemplo, pessoas com pontuações baixas terão velocidades menores de internet, acesso restringido a restaurantes, casas noturnas ou campos de golfe, e a remoção do direito de viajar livremente para o exterior com, como é descrito, “controle restritivo no consumo em locais para passar as férias ou empresas de viagens.” Pontuações influenciarão a capacidade das pessoas de fazer aluguéis, a habilidade de ter um seguro ou pedir um empréstimo e até mesmo benefícios da segurança social. Cidadãos com pontuações baixas não serão contratados por certos empregadores e serão proibidos de preencher certas vagas, incluindo construção civil, jornalismo e campos legais, onde a pessoa claramente precisa ser considerada confiável. Cidadãos com poucos pontos também serão restringidos quando tentarem matricular-se ou a seus filhos em escolas particulares mais caras. Não estou inventando essa lista de punições, é a realidade que cidadãos chineses vão encarar. Como o documento do governo informa, o sistema de crédito social “permitirá que os confiáveis andem por todos os lados sob o Sol enquanto dificulta os sem créditos de darem um único passo.”

De acordo com Luciano Floridi, professor de Filosofia e ética da informação da Universidade de Oxford e diretor de pesquisa no Instituto da Internet de Oxford, houveram três “mudanças descentralizadoras” críticas que alteraram nossa visão do auto-entendimento: o modelo de Copérnico da Terra orbitando o Sol, a teoria da seleção natural de Darwin e a alegação de Freud de que nossas atividades diárias são controladas por uma mente inconsciente.

Floridi acredita que agora estamos entrando em uma quarta mudança, onde o que fazemos online e offline se unem para se tornar uma onvida. Ele argumenta que, ao passo que nossa sociedade se torna cada vez mais uma infoesfera – uma mistura de experiências virtuais e físicas – estamos adquirindo uma personalidade onvida – diferente do que somos de forma inata no “mundo real.” Vemos isso largamente no Facebook, onde as pessoas apresentam um retrato editado ou idealizado das próprias vidas. Pense nas suas experiências com o Uber. Você é um pouco mais legal com o motorista porque sabe que receberá uma nota? Mas as notas do Uber não são nada comparadas ao Peeple, um aplicativo lançado em março de 2016 que funciona como um Yelp para humanos. Ele permite que você dê notas e críticas para todos que conhece – seu cônjuge, vizinho, chefe e até mesmo ex-namorados(as). O perfil mostra um “Número Peeple,” uma pontuação baseada em todas as respostas e recomendações que você recebe. O preocupante é que depois que seu nome está no sistema do Peeple, fica lá para sempre. Não dá para cancelar.

Peeple proibiu certos comportamentos nocivos, incluindo mencionar condições privadas de saúde, profanidade ou sexismo (embora isso possa ser objetivamente declarado). Mas há poucas regras sobre como as pessoas são pontuadas ou padrões de transparência.

O sistema de confiança da China pode ser voluntário por enquanto, mas já está tendo consequências. Em fevereiro de 2017, a Suprema Corte das Pessoas do país anunciou que 6,15 milhões de seus cidadãos haviam sido proibidos de pegar voos nos últimos quatro anos por más ações sociais. A proibição está sendo descrita como a um passo da listra negra no SCS. “Assisamos um memorando […] com mais de 44 departamentos do governo para limitar as pessoas ‘descreditadas’ em múltiplos níveis,” diz Meng Xiang, chefe do departamento executivo da Suprema Corte. Outros 1,65 milhão de pessoas na lista negra não podem pegar trens.

O ponto onde esses sistemas realmente caem em território aterrorizante é que a definição de confiável dos algoritmos é injustamente rígida. Não levam contexto em consideração. Por exemplo, uma pessoa pode perder o vencimento de uma conta ou multa porque estavam no hospital; outra pessoa pode realmente estar evitando os pagamentos. E aí está o desafio que encara a todos nós no mundo digital, e não só os chineses: se algoritmos que determinam as vidas das pessoas vieram para ficar, precisamos descobrir uma forma deles entenderem nuances, inconsistências e contradições inerentes aos seres humanos, e como poderiam refletir a vida real.

Crédito: Kevin Hong.

Você poderia imaginar o plano de confiança da China como um encontro entre o livro 1984 de Orwell com os cães de Pavlov. Aja como um bom cidadão, seja recompensado e farão parecer que você está se divertindo. É importante lembrar, no entanto, que sistemas de pontuação estão presentes no Ocidente há décadas.

Há mais de 70 anos, dois homens chamados Bill Fair e Earl Isaac criaram as pontuações de crédito. Hoje, as empresas usam pontuações FICO para determinar muitas decisões financeiras, incluindo a taxa de juros de um financiamento ou se determinada pessoa deveria poder pedir um empréstimo.

A maior parte dos chineses nunca tiveram crédito, então não podem conseguir crédito. “Muitas pessoas não têm casas, carros ou cartões de crédito na China, então esse tipo de informação não tem como ser medido,” explica Wen Quan, um blog influente que escreve sobre tecnologia e finanças. “O Banco Central tem os dados financeiros de 800 milhões de pessoas, mas somente 320 milhões têm um histórico tradicional de crédito.” De acordo com o Ministério do Comércio chinës, a perda econômica anual causada por falta de informação de crédito é de mais de 600 bilhões de yuan (R$ 296,26 bi).

A falta de um sistema nacional de crédito na China é o motivo pelo qual o governo está tão convencido de que pontuações de crédito estão atrasadas e são muito necessárias para consertar o que descrevem como “déficit de confiança.” Em um mercado mal regulado, a venda de contrabando e produtos abaixo do padrão são grandes problemas. De acordo com a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econömico (OECD), 63% de todos os produtos falsificados, de relógios a bolsas a papinha de bebê, originam-se da China. “O nível de micro-corrupções é altíssimo,” Creemers diz. “Então, se esse sistema em particular resultar em prestação de contas e supervisão eficientes, provavelmente será recebido de bom grado.”

O governo também argumenta que o sistema é uma forma de assimilar as pessoas deixadas de fora dos sistemas tradicionais de crédito, como estudantes e famílias de baixa renda. A professora Wang Shuqin, do Escritório de Filosofia e Ciências Sociais na Universidade Capital Normal na China, recentemente teve o lance vencedor para ajudar o governo a desenvolver o sistema que ela descreve como “Sistema Chinês de Fé Social.” Sem tal mecanismo, fazer negócios na China é arriscado, ela frisa, já que cerca de metade dos contratos não são mantidos. “Dada a velocidade da economia digital, é crucial que as pessoas possam verificar rapidamente a confiabilidade de crédito de outros,” diz ela. “O comportamento da maioria é determinado pelos pensamentos que os cercam. Uma pessoa que acredita nos valores centrais do socialismo se comporta mais decentemente.” Ela considera os “padrões morais” que o sistema avalia junto aos dados financeiros como um bônus.

De fato o objetivo do Conselho do Estado é aumentar a “mentalidade honesta e níveis de crédito de toda a sociedade” de modo a melhorar “a competitividade em geral do país.” É possível que o SCS seja, na verdade, uma forma mais transparente e desejável de supervisão em um país que tem um longo histórico de ficar de olho em seus cidadãos? “Como uma pessoa chinesa, sabendo que tudo que faço online está sendo rastreado, eu preferiria saber dos detalhes do que está sendo monitorado e usar essa informação para aprender como seguir as regras?” diz Rasul Majid, um blogueiro chinês morador de Xangai que escreve sobre design comportamental e psicologia nos jogos. “Ou eu preferiria viver na ignorância e esperar/desejar/sonhar que a privacidade pessoal ainda existe e que nossos corpos governamentais nos respeitam o suficiente para não tirar vantagem de nós?” Simplificando, Majid acredita que o sistema dá um pouquinho mais de controle aos seus dados.

Crédito: Kevin Hong.

Quando digo aos ocidentais sobre o Sistema de Crédito Social na China, suas respostas são fervorosas e viscerais, mesmo que já estejamos dando notas a restaurantes, filmes, livros e até mesmo médicos. O Facebook, enquanto isso, agora é capaz de te identificar em fotos sem ver seu rosto; só precisa das suas roupas, cabelo e tipo corporal para te marcar em uma imagem com 83% de precisão.

Em 2015, o OECD publicou um estudo revelando que nos EUA há pelo menos 24,9 dispositivos conectados a cada 100 habitantes. Todos os tipos de empresas analisam o “big data” emitido desses dispositivos para entenderem nossas vidas e desejos, e para preverem nossas ações de formas que nem mesmo nós poderíamos.

Governos ao redor do mundo já entraram no negócio do monitoramento e avaliação. Nos EUA, a Agência de Segurança Nacional (NSA) não é o único olho digital oficial seguindo os movimentos de seus cidadãos. Em 2015, a Administração de Segurança do Transporte dos EUA propôs a ideia de expandir as checagens prévias de histórico pessoal para incluir registros nas mídias sociais, dados de localização e histórico de compras. A ideia foi rejeitada após fortes críticas, mas isso não significa que esteja morta. Já vivemos em um mundo com algoritmos previsores que determinam se somos uma ameaça, um risco, um bom cidadão e até mesmo se somos confiáveis. Estamos chegando mais perto do sistema chinês – a expansão da pontuação de crédito à pontuação da vida – mesmo que não percebamos.

Estamos, então, a caminho de um futuro onde todos seremos marcados na internet com nossos dados minerados? A tendência é certamente esta. Exceto por uma possível revolta civil em massa que reivindique a volta da privacidade, estamos entrando em uma era onde as ações de um indivíduo serão julgadas pelos padrões que não podem controlar e onde esse julgamento não pode ser apagado. As consequências não são somente problemáticas, são permanentes. Esqueça seu direito de apagar ou ser esquecido, de ser jovem e tolo.

Embora possa ser tarde demais para impedir essa nova era, ainda temos escolhas e direitos de que podemos usufruir agora. Para começar, precisamos ser capazes de dar notas aos que dão notas. No seu livro O Inevitável, Kevin Kelly descreve um futuro onde os que observam e os observados vão se avaliar de forma transparente. “Nossa escolha central agora é de se a supervisão será um panóptico secreto de mão única ou um tipo de ‘cossupervisão’ mútuo e transparente que envolve supervisionar os supervisores,” ele escreve.

Nossa confiança deveria começar com indivíduos dentro do governo (ou seja quem for que controla o sistema). Precisamos de mecanismos confiáveis para garantir que avaliações e dados sejam usados de forma responsável e com nossa permissão. Para confiar nesse sistema, precisamos reduzir os fatores desconhecidos. Isso significa tomar medidas que reduzam a opacidade dos algoritmos. O argumento contra divulgações obrigatórias é de que se todos souberem o que acontece por trás dos panos, o sistema poderia ser sabotado ou invadido. Mas se os seres humanos estão sendo reduzidos a uma pontuação que poderia afetar suas vidas significativamente, precisa haver transparência no funcionamento da pontuação.

Na China certos cidadãos, como oficiais do governo, provavelmente serão considerados acima do sistema. Qual será a reação pública quando suas ações desfavoráveis não afetarem suas pontuações? Dá para prever os Papéis do Panamá 3.0 por fraudes na reputação.

Ainda é muito cedo para saber no que uma cultura de monitoramento constante com pontuações vai resultar. O que acontecerá quando esses sistemas, traçando o histórico social, moral e financeiro de uma população inteira, entrarem em força total? Quão mais profunda será a erosão da privacidade e liberdade de expressão (há muito sob ataque na China)? Quem irá decidir o caminho que o sistema seguirá? São todas questões que precisamos considerar, e em breve. Hoje a China, amanhã um lugar próximo de você. As verdadeiras perguntas sobre o futuro da confiança não são tecnológicas ou econômicas; são éticas.

Se não formos vigilantes, a confiança distribuída poderia se tornar a vergonha em rede. A vida se tornará uma competição de popularidade sem fim, com todos nós batalhando pela maior pontuação que só alguns podem alcançar.

Este é um trecho de Em Quem Você Pode Confiar? Como a Tecnologia Nos Uniu e Por Que Pode Nos Afastar (Portfólio Penguin) (tradução livre) por Rachel Botsman, publicado em 4 de outubro. Desde que esta peça foi escrita, o Banco da China adiou as licenças das oito empresas que conduziam pilotos de crédito social. Os planos do governo de lançar o Sistema de Crédito Social em 2020 continuam, sem mudanças.

Texto traduzido por Cláudio Ribeiro do artigo original do jornal The New York Times.